Quando a gente conhece uma pessoa, construímos uma imagem dela. Esta
imagem tem a ver com o que ela é de verdade, tem a ver com as nossas
expectativas e tem muito a ver com o que ela "vende" de si mesma. É pelo
resultado disso tudo que nos apaixonamos. Se esta pessoa for bem
parecida com a imagem que projetou em nós, desfazer-se deste amor, mais
tarde, não será tão penoso. Restará a saudade, talvez uma pequena mágoa,
mas nada que resista por muito tempo. No final, sobreviverão as boas
lembranças. Mas se esta pessoa "inventou" um personagem e você caiu na
arapuca, aí, somado à dor da separação, virá um processo mais lento e
sofrido: a de desconstrução daquela pessoa que você achou que era real.
Desconstruindo Flávia, desconstruindo Gilson, desconstruindo Marcelo.
Milhares de pessoas estão vivendo seus dias aparentemente numa boa, mas
por dentro estão desconstruindo ilusões, tudo porque se apaixonaram por
uma fraude, não por alguém autêntico. Ok, é natural que, numa
aproximação, a gente "venda" mais nossas qualidades que defeitos.
Ninguém vai iniciar uma história dizendo: muito prazer, eu sou
arrogante, preguiçoso e cleptomaníaco. Nada disso, é a hora de fazer
charme. Mas isso é no começo. Uma vez o romance engatado, aí as defesas
são postas de lado e a gente mostra quem realmente é, nossas gracinhas e
nossas imperfeições. Isso se formos honestos. Os desonestos do amor são
aqueles que fabricam idéias e atitudes, até que um dia cansam da
brincadeira, deixam cair a máscara e o outro fica ali, atônito.
Quem se apaixonou por um falsário, tem que desconstruí-lo para se
desapaixonar. É um sufoco. Exige que você reconheça que foi seduzido por
uma fantasia, que você é capaz de se deixar confundir, que o seu desejo
de amar é mais forte do que sua astúcia. Significa encarar que alguém
por quem você dedicou um sentimento nobre e verdadeiro não chegou a
existir, tudo não passou de uma representação – e olha, talvez até não
tenha sido por mal, pode ser que esta pessoa nem conheça a si mesma, por
isso ela se inventa.
A gente resiste muito a aceitar que alguém que amamos não é, e nem nunca
foi, especial. Que sorte quando a gente sabe com quem está lidando:
mesmo que venha a desamá-lo um dia, tudo o que foi construído se manterá
de pé.
Martha Medeiros
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