Durante algum tempo, me senti fora de mim. Antes
que você pense que estou bêbada, sob o efeito de alucinógenos ou com
algum sintoma de esquizofrenia, explico: eu não me sentia confortável
com meu jeito de ser.
Acho que a gente passa
boa parte da vida tentando descobrir quem é. Existe uma fase em que
achamos que temos que provar algo para alguém (pode ser pai, mãe, tio,
professor, amigo). Já tentei agradar outras pessoas inventando uma
espécie de personagem. É chato, dá trabalho, cansa e no final do dia a
gente se sente uma farsa, quase um lixo.
Já disse que gostava de
futebol para um cara que era louco pelo Grêmio. E olha que eu não sei o
que é impedimento (já tentaram, inutilmente, me explicar mais de cinco
vezes). Já disse que ia terminar a faculdade de Direito para agradar a
minha mãe (não consegui e larguei na metade) e a de Psicologia para
agradar meu pai (não consegui e larguei um ano antes de me formar). Já
disse tanta coisa e depois me arrependi.
Já fiz tanta coisa só para
gostarem de mim. Pura carência. Puro medo de não ser aceita. Puro
engano. Até que chegou uma hora em que eu decidi ter um papo bem sério
comigo mesma. Me chamei num cantinho e disse: escuta aqui, você está
querendo enganar quem?
A gente se passa a perna
constantemente. E o pior: sem a menor vergonha na cara. E fazemos de
novo, de novo, de novo. Até a hora do basta. Acredito que a Hora do
Basta é aquela hora em que o mundo para um segundo de girar, uma luz
forte e assustadora se acende bem na nossa fuça e a gente entende o que
diabos está fazendo no mundo. Porque todo mundo aqui tem uma missão. É
ou não é?
Não dá para viver de
aparências. Somos o que somos. Sem máscara, sem fingimentos, sem
esforço. Mas isso eu só entendi depois de algum tempo. E foi aí que
comecei a viver de verdade.
Quer saber quando as
coisas começaram a dar certo? Quando decidi que ia viver minha vida de
modo que quando eu deitasse a cabeça no travesseiro me orgulhasse a cada
segundo de erro por erro, acerto por acerto, defeito por defeito,
qualidade por qualidade. Sem o menor medo, sem o menor pudor e com o
maior respeito não por uma imagem que criei, mas por uma essência que é
natural e sem retoques.
E eu sou assim como você
vê: sensível ao extremo, dramática até dizer chega, um pouco sem
paciência com lerdeza, dona de um humor matinal quase azedo, com um
caminhão de defeitos chatos e outros tantos incorrigíveis, mas com uma
franqueza no tom da voz e no brilho do olhar. Se você não gosta do meu
natural, tudo bem, é direito seu. Não vou me maquiar na tentativa de
você gostar de mim.
By Clarissa Corrêa
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